Hoje vi uma borboleta a voar pelos caminhos do vento.
Era branca como uma página por escrever e nas bordas de suas asas um caminho negro a tingia até as extremidades.
Ela pousou bem perto de mim, como se não conhecesse a natureza assassina do homem, e então me pus a divagar:
Como lagarta como seria sua pele? Verde talvez, com finíssimos pelos a cobrir-lhes partes do corpo, suas patas, miúdas, grãos de areia viventes, olhos negros e profundos, escondidos numa cara particularmente feia.
Em qual planta encontrara seu sustento? Na frondosa ameixeira que cumpre seu ciclo de outono e me presenteia com frutos entre o doce e o azedo? Poderia ser no imponente cedro, que se data de meus ancestrais? Ou quem sabe de um novíssimo dente-de-leão que nasce como o sol e ao apagar-se em lua peluda espalha seus filhos ao vento?
Continuei ali, imóvel fazendo parte daquela cena, a borboleta, o quintal e eu, todos sem querer nada mais que estar ali, parados e vivos.
Como pode o feio se converter no belo? E o que preso no solo é, converte-se no voar livre da brisa?
Que quando feia maltrata as folhas verdejantes de meu jardim e que quando bela, embeleza ainda mais as cores de minhas flores.
Que obra tão sutil faria essa singela magia? Não havendo nada mais que dar o belo, e a que bela paisagem já fora... que belo não mais é?
Foi nesse ponto que percebi que a bela voadora já não estava mais imóvel a me espreitar.
Procurei rápido por seu rastro e não vi mais suas cores.
Nesse ponto entendi:
Entendi....
Que enquanto me arremesso na compreensão do belo, ele se vai e me privo de mais um segundo do momento exato de sentir a saudade da despedida, que bate as asas no silêncio do meu quintal.